domingo, 25 de maio de 2014

Tenho Tourette: conto ou não conto às pessoas com quem convivo?

Essa é uma questão que preocupa muito os pais de quem tem Tourette e os próprios portadores de tiques. Oriento que para decidir como lidar com essa situação conversem com seu psiquiatra e com seu terapeuta. Mas vou elencar aqui alguns tópicos para que ajudem a pensar no tema:
1- Preconceito: as pessoas têm medo de dizer que sofrem de algum problema mental pois existe muito preconceito. É verdade. Não há problema nenhum em dizer "sou diabético", "tenho pressão alta" ou "estou gripado". No entanto, dizer "tenho depressão", "tenho Tourette" pode levantar a pulga de que a pessoa é louca, é doente mental, não é inteligente etc. E isso dá medo: como vão nos olhar se souberem que fazemos coisas que não queremos? Se por um lado ao esconder nossas dificuldades estamos nos protegendo de julgamentos alheios, por outro lado, estaremos perpetuando o preconceito, pois estamos nos comportando como os errados fôssemos nós e não a sociedade preconceituosa. Além disso, como combater o preconceito se não educamos as pessoas sobre o que de fato é o nosso problema?
2- Conseguir tolerância e ajuda: se as pessoas não sabem de nossas dificuldades e nossos limites, como poderão nos compreender e nos respeitar? Por exemplo, se uma pessoa com coprolalia não explica que tem tiques involuntários, será considerada mal-educada. No entanto, se explicar que tem um tique que é difícil de controlar que a faz dizer coisas que não deve, existe a possibilidade de que as pessoas consigam ignorar esse comportamento, pois não se sentirão pessoalmente ofendidas.
3- Estímulo à solidariedade: vivemos em um mundo individualista. Se nos retraímos e escondemos os nossos problemas, como poderemos esperar que as relações se modifiquem? Como esperar que o mundo se torne mais solidário se não pedimos solidariedade?
4- A união faz a força: se todos os que sofrem de um determinado problema se juntam em sua dor, encontram forças para lutarem juntos por uma causa comum. Para falar mais alto, devem falar em uníssono. Assim, aumentam as chances de que sejam ouvidos em suas necessidades e requisições.

Sei que falar é fácil e a realidade é bem difícil. Atendo muitos profissionais competentíssimos que sofrem com a ST (médicos, empresários, engenheiros, delegados,até um piloto de avião!) e preferem não se expor. A situação é de fato delicada, em especial para quem ainda não está bem colocado no meio profissional. Temem ter tiques em uma entrevista e serem reprovados. Temem ser discriminados quando surgem oportunidades de promoção. Tudo isso pode de fato acontecer e continuará acontecendo se não houver mais informação disponível para reduzir o preconceito.
Em relação às crianças é mais fácil, pois elas estão em formação e a escola é o lugar da educação e também do aprendizado da tolerância social. E as crianças recebem as informações com muito menos preconceito. Por isso é fundamental que nas escolas seja dito abertamente que fulano tem tiques quando for necessário; isso pode acabar com o bullying.

Enfim, o preconceito deve ser combatido por todos, mas cada um sabe de seus limites e até onde pode ir nessa causa. E lembrando que hoje é diferente de amanhã. Se hoje não for possível , amanhã talvez seja.

  

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