CASOS ANTIGOS DE TOC EM FAMOSOS, COMO O DO CANTOR ROBERTO CARLOS, ENCORAJAM ADOLESCENTES A PROCURAR TRATAMENTO
Alexandre Rezende/Folhapress |
MAYRA MALDJIAN
DE SÃO PAULO
Inquieta, Andressa Freitas de Souza, 23, bota-se de pé. "Sabe o que é? Se eu não lavar as mãos, não vou conseguir conversar com você."
A garota vê sujeira onde, aparentemente, não há. "Se eu tocar no chão, no rejunte dos pisos, por exemplo, acho que vou me contaminar".
A aflição só passa quando ela abre a torneira da cozinha: "Senão a mente trava", explica, esfregando as mãos com detergente.
Andressa tem TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), um distúrbio mental que afeta cerca de 4 milhões de jovens e adultos no Brasil. "A obsessão é aquele pensamento, mesmo sem sentido, que a pessoa não consegue tirar da cabeça. E a compulsão é o ritual feito para afastá-lo", explica Ana Hounie, psiquiatra do Hospital das Clínicas de São Paulo.
De acordo com a especialista, qualquer um pode desenvolver o TOC. E, muitas vezes, os primeiros sinais despontam na adolescência.
CHEIOS DE MANIAS
Prisioneira de inúmeras manias, que se acumularam e se substituíram, Andressa começou a ir mal na faculdade de enfermagem e largou tudo no segundo semestre.
"Quando ia estudar, era o caderno deste jeito, a caneta assim, o estojo ali... Insuportável." Como se não bastasse a fissura pela higiene, ela também se apega à simetria.
No ano seguinte, aos 19, a mãe chegou em casa afobada, sacudindo uma revista: "Olha, Andressa, você tem a mesma coisa que o Roberto Carlos!".
A revista, que já era antiga, contava que o cantor não saía de um lugar pela porta que entrou, não usava marrom e não dizia palavras negativas: parou até de cantar um de seus sucessos, "Quero Que Vá Tudo pro Inferno".
Preocupada, Andressa começou a pesquisar sobre o TOC e encontrou outro caso famoso, o da modelo e atriz Luciana Vendramini. Ela ficou entre 1999 e 2003 sem trabalhar, tempo que levou para vencer a doença. No início, ela só conseguia dormir depois de ver três táxis amarelos. No auge, ficou dez horas no chuveiro, esperando um pensamento bom vir à mente.
De imediato, Andressa procurou um psiquiatra e começou a se tratar com remédios. "Quando ele me disse que o TOC não tinha cura, eu comecei a chorar", lembra.
Há um ano, Diogo*, 12, também encara o tratamento recomendado -medicamentos (como antidepressivos) e terapia. Ele é da turma da limpeza, mas nada o atrapalha na escola, já que a região "contaminada" está em casa. Discreto, diz que não quer "parecer estranho". Às vezes, o transtorno é tão intenso que chega a afastar seus portadores até de pessoas queridas. É o caso de João*, 19, que quando era criança não conseguia tocar na irmã, porque algo dentro da sua cabeça dizia que ela era "suja".
Naquele tempo, criou outro comportamento repetitivo: engolir saliva olhando para cima, "para não absorver algo do inferno". Aos 17, "achava que minha mãe ia morrer e rezava para isso não se concretizar".
Hoje, no segundo tratamento, ainda se incomoda com alguns pensamentos, mas uma rápida oração é o suficiente para acalmá-lo.
ENQUANTO É TEMPO
"O Roberto e a Luciana não têm ideia do quanto eles encorajam, até hoje, as pessoas", conta a educadora Maura Carvalho, que fundou, em 1996, a Astoc (Associação Brasileira de Síndrome de Tourette, Tiques e Transtorno Obsessivo-Compulsivo), junto com outras três mães.
Comum entre os jovens com o transtorno, a vergonha e a discrição, na verdade, só atrapalham. Quanto mais tarde o TOC for diagnosticado, mais difícil fica controlá-lo.
"O primeiro remédio é, na verdade, a informação", explica. De acordo com a educadora, é importante que as famílias e as escolas estejam atentas e preparadas para dar suporte e tornar tudo o mais natural possível.
"Se o Rei tem TOC, qual é o problema de nossos filhos e alunos terem, poxa?", acrescenta, entre risos.
* Nomes fictícios
Todos os dias, antes de dormir, andressa, 23, faz omesmo ritual com o par de chinelos..
primeiro, checa se as solas estão sem sujeirinhas
depois, posiciona o par sobre a risca formada entre os pisos e começa a contagem...
..."um, dois, um, dois, um dois", tocando o chinelo com os dedos
se, durante o ritual, ela ouve um barulho, é preciso recomeçar...
TIRA-TEIMA
Antes de procurar ajuda, avalie o seu comportamento
É TOC
Não conseguir sair do chuveiro até se ensaboar por um número determinado de vezes
Dar repetidas batidinhas em portas ou em maçanetas
Não sair do lugar até que os cadarços dos tênis estejam amarrados simetricamente
NÃO É TOC
Gastar 20 minutos lavando e cuidando dos cabelos todos os dias antes de ir para a escola
Repetir uma música até decorar a letra ou ver inúmeras vezes um vídeo engraçado
Deixar o guarda-roupa e as gavetas arrumados antes de sair de casa
SOS TOC
Grupos de apoio e orientação de tratamento
ASTOC - SÃO PAULO
www.astoc.org.br
RIOSTOC - RIO DE JANEIRO
www.riostoc.org.br
AGATOC - PORTO ALEGRE
agatoc@hotmail.com
ASTOCPE - RECIFE
astocpe@gmail.com
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